sábado, 25 de julho de 2009


Naquele tempo as coisas eram diferentes. A escolaridade não era necessariamente um privilégio de ricos, só que o pobre tinha que ter conhecimento, boa vontade e sorte para estar numa escola pública.
As escolas públicas eram as melhores, os novos alunos faziam a Prova de AdmissãoPor isso, poucas pessoas tinham escolaridade, embora soubessem as letras. A cidade de São Salvador moía-se na negritude com penteados black power.
Os marmanjos esgueiravam-se pelas esquinas, encostados em um poste qualquer, puxando uma brasa e falando lento, como os carinhas bonitos da TV preto e branco. As putas do Pelourinho costumavam se arrumar cedo, andavam nas esquinas para lá e para cá procurando um bom espaço. A todo momento, pernas e peitos de fora, oferecidos em troca de pouco dinheiro, um teco, uma dormida segura.
As pessoas de bem, da igreja, do bar da esquina e dos restaurantes passavam sempre com pressa, costumavam olhar reto ou para o chão para não dar ousadia. Os jovens fingiam não ver, assim como os ambulantes que passavam quase correndo. Era assim a cidade de São Salvador nos anos 70, ali pelas bandas da Ladeira da Praça.
Para quem morava na Barroquinha, o dia começava cedo. A maioria das pessoas que moravam ali, eram ambulantes e tinham em suas costas um grande saco de roupas ou bagulho. Subir e descer a ladeira todos os dias, comer a comida de Dona Nina sem mal olhar para o lado.
Todo mundo conhecia o mau humor de Dona Nina. Vagabundos, filhos-da-puta e suas mães, travestis e cachaceiros conheciam bem a fama e o cabo de sua vassoura daquela senhora com voz tenebrosa e enormes ancas. Quem não tinha dinheiro, quem reclamsse ou rebolasse demais poderia levar uma sova nas costas e onde fosse mais possível.
Bem acima da ladeira, na esquina, ficava a banca de revista do Seu Vavá. Senhor simpático, franzino, conhecedor de tudo o que se passava na política e no mundo. Todos o respeitavam. Conhecia as pessoas pelo nome e os pronunciava com polidez de um bom homem. Bom mesmo era a o comércio da Ladeira da Praça. Ali sim, era onde se viam as maiores futricas e confusões. As futricas ao dia, as confusões na noite. Dali para o Mercado Modelo era um pulo, e tropar com com a dona do bar da esquina era uma cilada por causa dos fiados incansáveis dos finais de semana. Xingamentos proporcionais ao mar da Barra.
Bom mesmo era beijar na boca no cinema Itaguary, ali em frente à praça Castro Alves. Namoradinhos que apertavam as mãos na praça costumavam assistir matinês, cheios de não-me-toques. É assim que era, é assim que continua a Cidade Baixa na minha memória.

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